segunda-feira, 27 de junho de 2011

Jornalista premiado nos EUA é imigrante ilegal

Tem escrito para alguns dos melhores jornais dos Estados Unidos, venceu um prémio Pulitzer pelas suas reportagens sobre o massacre de Virgínia Tech, mas tinha um segredo que já não estava a conseguir guardar. Jose António Vargas é imigrante ilegal nos EUA.

“Não posso mais esconder isto, não posso simplesmente deixar as coisas andar”, disse Jose Antonio Vargas numa entrevista à estação de televisão ABC. O seu segredo estava a corroêlo por isso publicou nesta quarta-feira um artigo no “The New York Times” a contar a sua história. Jornalista premiado, sabe que corre o risco de ser deportado mas mesmo assim resolveu contar que é imigrante ilegal.

“Sou um de tantos, tantos. Não somos quem pensam que somos e todos merecemos dignidade”, disse Jose Antonio Vargas à ABC. Agora que falou do seu passado, promete lutar para que o Deram Act avance, a proposta do Presidente Barack Obama que abrirá caminho à legalização dos cerca de 11 milhões de pessoas que vivem sem papéis nos EUA.

“Podem chamar-me o que quiserem, eu sou americano”, explica o jornalista “No meu coração, sou americano”. Apesar de ter nascido nas Filipinas, Jose Antonio Vargas cresceu na Califórnia, estudou na escola secundária de Mountain View e foi aí que começou a colaborar com um jornal local. Mais tarde viria a trabalhar para o “San Francisco Chronicle, até que foi contratado pelo “Washington Post”, já em 2004.

Fez várias reportagens e até documentários sobre a sida, o “casamento” entre os políticos e a Internet, mas viria a ser a cobertura sobre o massacre na universidade de Virgínia Tech – onde um aluno entrou armado e matou 32 pessoas em Abril de 2007 – a valer-lhe o mais prestigiado prémio de jornalismo. Foi um dos jornalistas do “Washington Post” a vencer o Pulitzer na categoria “Breaking News” em 2008.

O perfil de Jose Antonio Vargas não encaixa nos estereótipos mais comuns sobre os imigrantes ilegais. Na última década tem sido um jornalista de grande sucesso, conhecido pelas reportagens em Virgínia Tech mas também, por exemplo, pela entrevista que fez ao fundador do Facebook, Mark Zuckerberg. Tudo isto enquanto vivia nos EUA de forma ilegal. “E por que é que fiz tudo isso?”, perguntou ao jornalista da ABC, antecipando uma questão que certamente lhe iria ser feita. Depois responde: “Queria sobreviver. Queria viver. E queria saber realmente o que significa ser americano”.

Deixou as Filipinas quando tinha 12 anos, mas só quatro anos depois viria a saber que estava em situação ilegal.

Foi quando tentou tirar a carta de condução e lhe disseram que o seu “green card” – o documento que permite a cidadãos estrangeiros viver e trabalhar nos EUA – era falso. Aconselharam-no a não voltar, Vargas regressou a casa e foi contar ao avô o que tinha acontecido. Soube então que era um imigrante ilegal.

Primeiro tentou atenuar o sotaque, não queria que ninguém duvidasse de que era americano. Depois descobriu o jornalismo, quis trabalhar e percebeu que o sotaque não seria o maior dos seus problemas.

Enconder as fotos da família numa caixa de sapatos


Acabou por ceder àquele que é o caminho de tantos imigrantes ilegais.

Com documentos falsos, conseguiu uma carta de condução no estado de Oregon. “Uma pessoa tem de fazer o que tem de fazer”, disse à ABC. “Queria trabalhar, provar que era digno de estar aqui”. Ninguém duvidará de que o conseguiu. Foi com essa carta de condução que chegou a entrar na Casa Branca para fazer a reportagem sobre um jantar de Estado”.

O medo não passou com o tempo.

Vargas estava nervoso no dia do jantar na Casa Branca, e noutros dias também. “Cada vez que fazia isto pensava que me iam apanhar”. Nunca apanharam.

Sabe que poderá ser enviado de volta para as Filipinas, por isso terá demorado a ganhar coragem para falar do seu passado. Mas acabou por decidir-se quando viu, em Dezembro, ser rejeitado no Congresso o Dream Act, uma legislação que permitirá a legalização dos imigrantes que já cresceram nos Estados Unidos. É por essa proposta que agora fará campanha, por não acreditar que possam ser deportadas 11 milhões de pessoas. “Somos parte desta sociedade, e todos merecemos dignidade”.

Fonte: O País
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