sexta-feira, 29 de junho de 2012

Durante Fórum Senado Brasil 2012 filósofo e diplomata Sergio Rouanet diz que a religião não deve ser vista como ‘o ópio do povo’

Em conferência no Fórum Senado Brasil 2012, na noite de segunda-feira (25), o filósofo e diplomata Sergio Paulo Rouanet criticou a radicalização religiosa, que considera inconciliável com a política democrática, mas apoiou uma sociedade “pós-secular” em que setores religiosos enriqueçam o debate político por meio de “valores positivos”, como ideal de solidariedade.

Rouanet estabeleceu diferença entre o que chamou de integrismo, interpretação literal dos livros sagrados que visa à reorganização do Estado segundo a lei divina, e o fundamentalismo, que definiu como o “integrismo com violência”. Segundo Rouanet, a confusão entre os “mandamentos de Deus” e a lei do Estado continua pautando as disputas eleitorais em temas como aborto, clonagem e casamento entre pessoas do mesmo sexo.

Para o filósofo, as três grandes religiões monoteístas – cristianismo, judaísmo e islamismo – acabam convergindo em suas vertentes fundamentalistas, todas se inscrevendo na “guerra cósmica entre Deus e Satã”. Daí decorrem, por exemplo, o terrorismo islâmico e o repúdio, nos Estados Unidos, à teoria da evolução, formulada por Darwin, em prol do criacionismo bíblico.

Egos

Rouanet lembrou que na obra de Sigmund Freud a religião é vista como um freio contra a violência geral, por produzir o que o Pai da Psicanálise chamou de “ilusão necessária”. Esse processo consiste na cessão, a uma divindade ou messias, de boa parcela da individualidade (ego) dos integrantes de um grupo social. A crença nesse mediador aplaca a agressividade que se manifestaria de maneira instintiva, caso a ação fosse puramente individual, estabelecendo comunhão baseada na libido.

Sem essa ilusão, argumenta Freud, o homem não aceitaria os sacrifícios impostos pela civilização. No entanto, o mesmo Freud observa que a religião pode gerar violência por meio de choques entre seitas rivais:

Para Rouanet, apesar de o Estado liberal ter criado um espaço para a coexistência pacífica entre os cultos, o pessimismo de Freud foi “profético” quanto à transformação do integrismo em fundamentalismo.

A ideia de um sociedade pós-secular defendida por Rouanet baseia-se em conceitos expressos pelo filósofo alemão Jürgen Habermas, que enxerga a possibilidade de preservação do conteúdo das religiões, reconhecendo nestas o status de atores políticos. Ao aproveitar o potencial de mobilização desses grupos religiosos, sem, no entanto, permitir a eles o domínio do Estado, a sociedade pós-secular abriria espaço para o sentimento religioso que em vão o iluminismo, no século dezoito, e o marxismo, no século vinte, tentaram eliminar.

- Temo que o integrismo no Brasil, representado sobretudo por igrejas pentecostais, venha a ser a antessala do fundamentalismo, mas não se deve ver a religião como ‘o ópio do povo’ ou admitir a viabilidade de uma religião racional – alertou o filósofo.

Para Rouanet, os adeptos dessas igrejas podem ser despolitizados, mas não são apolíticos, e a efervescência religiosa pode repolitizar a sociedade e reativar o debate político reaproximando integristas do processo democrático.

Esta seria também uma alternativa ao “descarrilhamento” político provocado pelo ceticismo e o narcisismo, muito presentes em uma sociedade impregnada das chamadas leis do mercado.

Estiveram presentes ao fórum na noite de segunda os senadores Rodrigo Rollemberg (PSB-DF) e Cristovam Buarque (PDT-DF). O evento é coordenado pelo embaixador Jerônimo Moscardo, especialmente designado para o projeto pelo presidente do Senado, José Sarney.



Fonte: Agência Senado
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